De A a Z para a Música na Educação

De A a Z para a Música na Educação... por Manuel Rocha

Manuel Rocha

Manuel Rocha nasceu em Coimbra, em 1962. Licenciado em "docência de violino e músico de orquestra" (CEM Gnessin de Moscovo, URSS, 1988). É, desde 1988, professor de violino no Conservatório de Música de Coimbra, tendo ali exercido funções de diretor entre 2005 e 2017.

Como músico, em registo sonoro ou em palco, trabalhou sobretudo nos ambientes da chamada música popular portuguesa, com nomes como a Brigada Victor Jara (de que é membro desde 1977), Adriano Correia de Oliveira, Manuel Freire, Fausto, Vitorino, José Medeiros, Mísia, Filipa Pais, Carlos do Carmo, entre outros. Paralelamente, tem atividades de diversa natureza, de que destaca a série de documentários para a RTP sobre a música tradicional portuguesa, realizada a partir da série de Michel Giacometti e Alfredo Tropa "Povo que Canta". Colaborou com grupos de teatro, registou música (bandas sonoras) para cinema e televisão.

Integrou dois grupos de trabalho do Ministério da Educação para a reforma do Ensino Artístico Especializado, o último dos quais viria a fundamentar o desenho curricular em vigor. Fez parte da comissão organizadora do Festival 1001 Músicos. Foi indicado pelo Ministério da Cultura (2011) para integrar o grupo de trabalho junto da Comissão Europeia responsável por definir “O papel das instituições artísticas e culturais na promoção de um melhor acesso e de uma participação mais ampla na cultura. Sinergias entre a cultura e a educação, com destaque para a educação artística”.

Desenvolve atividade associativa, sindical e política, sendo dirigente sindical, membro da Assembleia Municipal de Coimbra e da Assembleia da CIM-Coimbra.

Clique no seguinte link para ler este A a Z:

A

de Arte.

Acontece quando se percebe aquilo de que é feito o mundo e se quer representá-lo. Para as crianças é idioma natural se encontrado desde o berço, para os artistas é exercício continuado. Em educação é utensílio de emancipação.

B

de Brincar.

A mais séria das ferramentas de conhecer o mundo, seus habitantes e existências. Dizia o Pintor ter “demorado oito anos a aprender a pintar como no Renascimento, e a vida inteira a aprender a pintar como as crianças”. Longa vai a discussão nos lugares da pedagogia, acerca de como fazer com que a vontade de aprender a arte dos sons (e as áreas todas do conhecimento) contenha os ingredientes da brincadeira, cruzados com os da vontade de saber.

C

de Cantar.

Maneira de fazer muita Música sem precisar de bens materiais. Entretanto alguém inventou administrativas flautas (belíssimo e malfadado instrumento) e outras complexidades; e esqueceu-se, por instantes apenas, de como se cantava nas rodas do recreio e nos trabalhos do campo. É urgente cantar mais.

D

de Dança.

É quando a vibração da música vai além da agitação das moléculas que compõem o corpo humano e faz despontar emoções sob a forma de gestos; ou como disse Balanchine “é a música que pode ser vista”.

E

de Escola.

Um lugar da educação, o único de que se espera tudo (até a perfeição). Enredada entre o que se quer (e pode) transmitir e o que se quer (e pode, e sabe) apreender, a Escola é a última fronteira da dignidade, desde a consciência de si até à dádiva do pão (quando falta em casa).

F

de Forma musical.

Processo pelo qual a música reflete as Civilizações (o jogo dos humanos e a sua relação com a Natureza) e as representa. A forma musical está sempre presente na educação musical, desde a cantiga de embalar à compreensão da obra mais complexa. A forma musical reproduz as configurações do que existe e do que haja para existir.

G

de Giacometti, Michel Maria (1929-1990).

Corso e etnólogo, escolheu ser sepultado em Portugal. Das sabedorias dos humanos, a de que mais se encantava era a música. Disse um dia que o que mais o seduzia na música deste povo eram os romances transmontanos e as polifonias minhotas, sinais das nossas habilidades mais preciosas. Graças a Michel Giacometti, e a poucos outros, vamo-nos despegando da alergia que o Portugal musical do Secretariado de Propaganda Nacional nos provoca ainda. Falta levar o seu trabalho às nossas escolas.

H

de Harmonia.

Para o senso-comum concórdia, para a música combinação (mesmo quando parece haver sonora discordância). Em matéria de educação é o mais sério dos assuntos, pois cantar e tocar “a vozes” é a expressão musical da valorização das diferenças e seus dotes de complementaridade.

I

de Improvisação.

Aquilo que o músico pode fazer quando sabe a música de cor. De veleidade mal-aceite (mesmo tendo sido recurso essencial da música antiga) passou a incensada qualidade nestes nossos tempos de provectas novidades. Mas não é uma coisa nem a outra, porque a invenção das notas não é nem menos, nem mais excelente do que a sua interpretação. Em música, o fazer é sempre criação.

J

de Jazz.

Escreve-se com “J” mas poder-se-ia escrever com “I”, a letra de “improvisação”. É Música “séria”, mais por mérito próprio do que por condescendência de quem a queria apartada. O Jazz é uma enciclopédia – distintas formas e estilos captam cultores em todo o mundo, muito além da Nova Orleães em que nasceu. É, a par da música “clássica” e da música da tradição oral, um testemunho maior da invenção sonora da Humanidade. Para os grandes compositores ocidentais o Jazz nunca foi um problema, mas só há pouco chegou às escolas do ensino artístico especializado (Conservatórios) onde vai fazendo o seu caminho.

K

de Kabalevsky, Dmitry Borisovich (1904-1987).

Compositor soviético e destacado pedagogo, professor catedrático no Conservatório Tchaikovsky de Moscovo. Considerava que a tarefa central do professor de música é a de levar os jovens a perceber emocionalmente a música enquanto fenómeno integral da vida, apaixonando-os pela arte dos sons. Para tal, criou uma didática da Expressão Musical, revendo curricula e programas a partir da convicção de que a educação de qualidade baseia-se sempre na utilização de recursos de qualidade. Por essa razão defendeu a promoção, em ambiente educativo, da música da tradição oral e dos grandes compositores da História da Música.

L

de Lopes-Graça, Fernando (1906-1994).

Compositor de muita música para as finalidades todas do Portugal do século XX, desde a inscrição nas correntes estéticas europeias até à criação “ao gosto popular”. O pensamento, a escrita opinativa e a obra musical de Lopes-Graça não fazem concessões ao “facilitismo” popularizante, mas interessam-se pela inscrição nas vidas das pessoas, como se prova pelo elevado número de cantores, profissionais e amadores, que viveram a sua obra coral. É que, como diz um dos estudiosos da obra de Lopes-Graça, “ainda que a sua música seja reputada de ‘difícil’, o certo é que não se aprende a gostar de café bebendo cevada”.

M

de Músico.

Aquele que exerce a música como profissão e aquele a quem se reconhece autoridade nesse domínio. Em Portugal, “músico” pode ainda ser sinónimo de vigarista, porém habilidoso, o que significa – ainda que pelo avesso – reconhecimento pela complexidade da função, e respetivo conteúdo sedutor. Em Portugal, nem sempre nos ficamos pelo essencial.

N

de Notas musicais.

As que antes de o ser (dós e sóis) já o eram (sons). No meu tempo de criança eram instrumento de tortura sob a forma de leitura “rezada”, coitadas – despidas de som, sem préstimo musical, reduzidas à condição do seu nome reconhecido numa austera parede de cinco linhas e quatro espaços. Ainda há quem as ensine assim, mas são muitos mais os que as apresentam como pigmentos do grande mural que é a Música.

O

de Orquestra Geração.

“Mais do que Música tocamos vidas”, diz de si mesmo o Projeto Orquestra Geração. É polémico, como tudo o que existe ao lado de existências, mas quem o frequenta (as tais vidas tocadas) considera-o essencial. Tem conhecido expansão sobretudo na área metropolitana de Lisboa, mas já motivou o aparecimento de projetos semelhantes um pouco por todo o país. Lugar de educação.

P

de Polifonia.

Cantar “a vozes” é coisa de que os portugueses gostam. Educar para a diversidade – também nas “fonias” das nossas escolas – também é revelar o bom resultado que se obtém quando, em ambiente de remar para o mesmo lado, nos dá para cantar a muitas vozes.

Q

de Quarteto.

Quando nos passar a febre das orquestras escolares havemos de descobrir os “etos” todos. E descobriremos certamente que educar em entusiasmo coletivo não depende da quantidade dos envolvidos, mas sim da capacidade de, ouvindo-se a si mesmo, conseguir ouvir os outros.

R

de Ruído.

É sempre aquilo que se sobrepõe (e impõe) aos sons de que se gosta e precisa, e ao silêncio também. A cada qual a sua definição de ruído, que pode ser música de elevador, som do martelo pneumático rasgando o alcatrão, superêxito cançoneteiro das manhãs da TV, playlist de loja de pronto-a-vestir. Como definir “ruído” com precisão quando, tantas vezes, tão bem se disfarça de Música?

S

de Silêncio.

“Nunca interrompas o silêncio se não for para o melhorar” (Beethoven).

T

de Textura (musical).

A tela da música, ponto de partida para as descobertas dos pigmentos, dos contornos, dos significados. Recurso educativo, portanto.

U

de Ut (queant laxis).

Dó, em início de vida.

V

de Valores.

A tarefa central da educação, também na educação musical, ali onde se revelam existências que, inevitavelmente, resultam em escolhas. Os valores da educação musical são os éticos, os morais, os estéticos, os culturais – a música que se fará é a sua expressão sonora.

W

de Wolferl.

Até a Mozart calhou ser criança. Quando, aos 6 anos de idade, se apresentou pela primeira vez em público, era pelo nome de Wolferl que respondia. Músico completo e genial, agente educativo tanto pelo que foi (a obra) como pelo que se disse ter sido (e se escreveu, contou e filmou).

X

de Xilofone, Xenákis, xotiça.

O Xis é a letra do alfabeto em que a escolha de termos musicais é quase descobrimento. Um instrumento de percussão, um compositor grego, uma dança popular de origem escocesa - afinal não é coisa pouca.

Y

de Yankelevitch, Yuri (1909-1973).

Pedagogo soviético, professor de violino no Conservatório Tchaikovsky, educou violinistas como Viktor Tretyakov, Grigori Zhislin, Pavel Kogan, Mikhail Kopelman, Vladimir Spivakov, Tatiana Grindenko, entre muitos outros. Publicou trabalhos metodológicos e de análise musical do reportório violinístico.

Z

de Zumbidor.

Instrumento musical constituído por uma pequena placa de madeira que se faz girar na ponta de um cordel. Emite um som semelhante ao do trovão, ao longe. É, em muitos lugares do mundo, um instrumento sagrado, mensageiro de divinas vozes, relacionado com rituais iniciáticos. É a prova de que um instrumento (qualquer que seja) nunca é apenas o som que emite, o encantamento que gera - é também os relatos de que é portador. Recurso educativo, mais um.

A APEM

A Associação Portuguesa de Educação Musical, APEM, é uma associação de caráter cultural e profissional, sem fins lucrativos e com estatuto de utilidade pública, que tem por objetivo o desenvolvimento e aperfeiçoamento da educação musical, quer como parte integrante da formação humana e da vida social, quer como uma componente essencial na formação musical especializada.

Cantar Mais

Cantar Mais – Mundos com voz é um projeto da Associação Portuguesa de Educação Musical (APEM) que assenta na disponibilização de um repertório diversificado de canções (tradicionais portuguesas, de música antiga, de países de língua oficial portuguesa, de autor, do mundo, fado, cante e teatro musical/ciclo de canções) com arranjos e orquestrações originais apoiadas por recursos pedagógicos multimédia e tutoriais de formação.

Saiba mais em:
http://www.cantarmais.pt/pt

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©  Associação Portuguesa de Educação Musical

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